sexta-feira, 6 de setembro de 2013

SAÚDE E HARMONIA - Terapia Corporal - O Toque Como Fator de Equilíbrio e Autoconhecimento

Terapia Corporal - O Toque Como Fator de Equilíbrio e Autoconhecimento

 

 O TOQUE DA SAÚDE E EQUILÍBRIO

Introdução

Muito se aborda a globalização e o acesso universal a informações em todos os campos de conhecimento, incluindo a Terapia Holística. Porém, mesmo no Brasil, de ampla tradição de sincretismo e fusão das mais variadas vertentes de pensamento, ainda deparamos com um separatismo entre as técnicas corporais orientais e ocidentais, bem como uma distância entre o discurso de paradigma holístico e uma real aplicação deste conceito, a tal ponto de ainda encontrarmos profissionais que iludem-se de atuar em questões físicas e outros, em aspectos psíquicos, como se tais existissem de forma isolada...
São inegáveis as qualidades técnicas das manobras corporais tradicionais, tais como o shiatsu, tuina, anma, sparsha, dentre outras, assim como é fundamental a contribuição da psicanálise quanto aos aspectos inconscientes de nossa personalidade serem corporificados. Contudo, ambas as vertentes ainda não convergiram, resultando em "massagistas" (termo totalmente inadequado à legislação brasileira...) que desconhecem o fato de seu trabalho pode resultar em catarses, como também em profissionais da vegetoterapia e bioenergética propondo técnicas de toque, respiratórias e posturais que já estariam eficientemente supridas nas já seculares técnicas corporais, como as já citadas, bem como as oriundas do yôga e tai-chi-chuan.
Cabe ao Brasil eliminar a iniciativa em superar desinformações, preconceitos e vaidades, promovendo a integração entre todas estas linhas complementares de tratamento, formando Terapeutas Corporais que honrem a sabedoria milenar, da mesma forma que abraçam a modernidade psicanalítica, fazendo justiça a que mais esta modalidade terapêutica seja integrante da Terapia Holística, atendendo a Clientela ciente de que físico-psíquico-social-transcendente é uma só unidade indissociável. 

Resultados

Constatou-se ganhos significativos oriundos do sincretismo entre as abordagens ocidentais modernas e orientais milenares da Terapia Corporal. As manobras corporais de tradições seculares, tais como shiatsu, tuina, anma, seitai, sparsha, dentre outras, mostraram-se mais adaptáveis a cada Cliente, em comparação às mais recentes, oriundas das linhas reichianas e neo-reichianas, tais como a bionergética. Em contraponto, a proposta analítica destas últimas são indispensáveis à interpretação emocional refletida via corpo, já que essa capacidade fora perdida no decorrer do tempo, no que se refere ao ensino e prática das técnicas orientais, na forma como nos chegam atualmente.
Clientes originados de queixas físicas apresentam resultados mais rápidos e eficazes quando a Terapia Corporal aflora as emoções reprimidas simultaneamente ao trabalho de toque. É perceptível ao tato do profissional, o relaxamento nas áreas antes tensas, imediatamente à manifestação da emoção e/ou lembrança que emerge sincronisticanente ao contato físico com a zona reflexa e/ou diretamente sobre a região corpórea. Da mesma forma, regiões sem tônus de pronto manifestam retorno da tonicidade, assim que afloram os sentimentos e lembranças induzidos pelo toque de volta à consciência. Quadros de dores e de dificuldade de movimentos apresentam reversão drástica, ainda que temporária, imediatamente à catarse emocional desencadeada pelo toque e indução verbal.

Ratificando o acima descrito, quadro similar ocorre com a Clientela de queixas emocionais, onde o trabalho de toque serve tanto para detectar quais regiões corpóreas estão refletindo o quadro psíquico, quanto para aflorar à consciência as emoções reprimidas, bem como lembranças de situações traumáticas.
Em ambas as situações, a PSICOTERAPIA HOLÍSTICA, incluindo o ACONSELHAMENTO, desempenha papel fundamental em facilitar ao Cliente a compreender o conteúdo aflorado, o que se mostra fundamental para que o quadro queixoso anterior não reincida. A catarse emocional por si só, apresenta resultado temporário, com imediata melhoria do quadro geral, porém, com retorno do estado original poucos dias após. A durabilidade do resultado é mantida quando o Cliente é simultaneamente amparado com técnicas de foco psicoterápico.

A inclusão do contato físico na relação CLIENTE e TERAPEUTA HOLÍSTICO acelera o ritmo e intensifica a terapia, traduzindo-se em resultados de espectro mais amplo e, uma aumento da frequência e intensidade nas transferências e contra-transferências, exigindo grande preparo do profissional.
Discussão

Todas as tradições terapêuticas seculares, das mais variadas culturas, incluem trabalhos corporais, em especial, técnicas de toque. Originalmente de enfoque holístico, era parte integrante a premissa do ser como um contínuo físico-psíquico-social-transcendente e que, independente do caminho terapêutico escolhido, é ilusória a idéia de tratar um tópico "separadamente" do todo. Assim sendo, a intervenção corpórea implica em simultânea atuação no psiquismo, nas relações com a sociedade e em sua conexão com o universo que somos.
Modernas ideologias, governos ditatoriais e o cientificismo mecanicista influenciaram uma ruptura no paradigma holístico terapêutico. Seja por necessidade de sobrevivência às perseguições, seja em concessões e adaptações para tentar enquadrar nos limites do "científico", fato é que ao século 20, terapias como shiatsu, tuiná, anma, seitai e similares, chegaram até nós amputadas de sua original tradição sistêmica, passando a tratar o "corpo" como se fosse uma "máquina", composta de "partes" a serem manipuladas pelo toque para que "funcionem" melhor... A excelência técnica das manobras corporais se manteve, porém, perdeu-se a "alma" em algum momento de sua história. 

A partir da década de 70, com o movimento da contracultura, "revolução aquariana", ecologia e retomada do paradigma holístico, as abordagens corporais se permitiram a reintegração com os conceitos de "energia", reassumindo a interação com meridianos (canais de circulação energética da acupuntura - terapia tradicional chinesa), chacras (ou chakras, vórtices de energia estudados na ayurvédica - terapia tradicional indiana) e "corpos sutis" (matrizes energéticas paralelas ao corpo material, conceito este comum a todas as culturas milenares). Ao mesmo tempo, readmitiu-se que a terapia pelo toque igualmente atua nas emoções, porém, sem aprofundar na questão, deixando de integrar ao trabalho a necessária metodologia de amparar o Cliente nas consequências oriundas dos sentimentos e memórias evocadas pelo toque.
Desenvolvendo-se de forma complementar, contamos com a Psicánalise, pela qual Freud demonstra a grande atuação das questões psíquicas nas somatizações, sendo até possível a reversão destas, como decorrência da análise, ao resgatar do inconsciente, os traumas, lembranças, emoções reprimidas e integrá-las ao consciente.
Quer seja por preocupar-se em manter-se dentro de uma certo paralelo com a metodologia científica (isolar-se do "objeto" estudado...), quer seja para evitar maiores controvérsias e envolvimentos, TOCAR o Cliente era algo fora de discussão, até a dissidência de Wilhelm Reich, que “corporificou” o inconsciente, identificando suas informações como uma bioenergia circulante (por ele denominada “orgone”).
A negação das emoções, impulsos, desejos oriundos do Id se dá pelo impedimento da livre passagem da bioenergia por meio da musculatura corporal, quer seja pela tensão excessiva (mais facilmente identificável...), ou pela ausência desta (falta de tônus), pois em ambas as situações, é prejudicado o livre fluxo energético. Observa-se aqui, um grande paralelismo (jamais assumido...) com as teorias da Terapia Tradicional Chinesa e seus Meridianos (caminhos preferenciais da energia circulante).
Reich extrapolou, concluindo que o inconsciente individual é corporal e que a repressão do material psíquico implica em bloquear energeticamente a circulação da informação, que evolui para tensões musculares, até culminarem em somatizações cada vez mais complexas e, paralelamente, a aparência corporal é igualmente reflexo das experiências psíquicas vividas: quanto mais um componente é mantido inconsciente, maior é o grau de somatização...

Analisando os Clientes, Reich e seus discípulos identificaram regiões corpóreas estatisticamente predominantes, nas quais os traumas psíquicos específicos a cada fase da vida tendem a ser sua energia-informação retida em sua circulação em direção ao inconsciente. Tal mapeamento, também conhecido como Couraças Musculares do Caráter, aproxima-se e muito das zonas tradicionalmente definidas para os Chacras (centros de energia), tanto nas tradições milenares da China, quanto da Índia.
Enquanto na abordagem freudiana, o Cliente segue seu próprio ritmo espontâneo de resgate do inconsciente, por meio de associações livres de idéias durante as consultas, na análise reichiana introduziu-se o TOQUE nas zonas musculaturas específicas (“couraças”), provocando a circulação da bioenergia e, com isso, o contato consciente com as emoções e lembranças reprimidas.
A linha reichiana "clássica", a Vegetoterapia, segue um padrão relativamente rígido e pré-fixado para a sequência de desbloqueio das couraças, enquanto que as chamadas correntes neoreichianas, como a Bioenergética (que tem Alexander Lowen como seu expoente...) são mais flexíveis quanto à ordem e formas de trabalhar os bloqueios, utilizando-se, além do toque, técnicas respiratórias e posturais, que contém muitos paralelos ao Yôga e Tai-Chi-Chuan... 

Estas últimas vertentes, de origens ocidentais e modernas, em contraponto com as demais linhas aqui inicialmentes descritas, milenares e orientais, permaneceram distanciadas, uma corrente desconhecendo totalmente a outra. Não raro deparamos com reichianos que desconhecem chacras e shiatsuterapeutas que nem sequer imaginam que desbloqueiam "couraças do caráter"...
Minha experiência pessoal na Terapia Corporal iniciou com as técnicas manipulativas orientais (shiatsu e tuiná); contudo, mais do que "relaxamento", comumente os Clientes experienciavam catarses emocionais. Ou seja, conhecendo ou não as teorias reichianas, sabendo ou não o que são "couraças", estamos literalmente colocando nossas mãos no inconsciente de quem atendemos e irá aflorar o material psíquico reprimido.
A ausência do toque ou o abuso deste, especialmente na infância, é fator determinante em boa parte dos traumas de cada indivíduo. Daí a Terapia Corporal ser fundamental no resgate de muitas destas questões.
Em nosso corpo, "congelamos" a lembrança histórica e emocional de certas questões vividas e o toque, intencionalmente ou não, convida a re-experimentar as sensações bloqueadas e a expressar os sentimentos reprimidos. A tendência desta situação é regressiva, pois toca-se uma questão em aberto do passado, comumente convidado à criança interior a novamente aflorar. Tal fator é ampliado porque o Terapeuta Holístico forma uma relação transferêncial com o Cliente, já que este tende a projetar no profissional, a persona de pai-mãe-cônjuge. É preciso o entendimento do conceito de TRANSFERÊNCIA e assumir as responsabilidades dos efeitos do toque sobre a pessoa atendida. Por exemplo, ao atender um indivíduo em estado de carência, há de se preparar para a possibilidade de ser visto como um objeto de amor e, consequentemente, conscientizar-se de que tal relação culminará em dor. Atentem que, numa relacionamento transferencial, o tocar pode ser interpretado de forma totalmente diversa da intenção original: 

" ... ao começar a trabalhar fisicamente com meus Clientes, sem perceber, eu procurava tocar a parte de trás do pescoço. Esse movimento inconsciente estava obviamente criando respostas diferentes em Clientes diversos. ... Quanto toquei o pescoço de uma Cliente que havia sido abusada quanto criança, ela ficou assustada, como se eu fosse arrancar sua cabeça. O mesmo contato, de meu ponto de vista, com um Cliente mais dependente, fez com que ele desejasse apoiar sua cabeça em minha mão. Quanto toquei o pescoço de uma Cliente com muitas questões referentes ao controle, meu gesto estimulou sua paranóia e sua suspeita, como se estivesse sendo manipulada para fazer algo que não desejava.A resposta mais condescendente veio de um Cliente a meu toque foi ter dor no pescoço e sentir-se sobrecarregado. Toquei outro Cliente na parte de trás do pescoço e seu maxilar elevou-se com orgulho, como se eu estivesse dando tapinha em suas costas. Assim, quando toco os Clientes, eles têm uma resposta que vem de suas histórias individuais, do que o contatto significou para eles no passado e de sua transferência comigo..."
HEDGES, LAWRENCE E.; HILTON, ROBERT e HILTON, VIRGINIA W. – Terapeutas em Risco – Perigos da Intimidade na Relação Terapêutica, Summus Ed., 1997.

Claro que situações transferênciais como as acima descritas, igualmente ocorrem em terapias que não fazem uso do toque, porém, é constatável que trabalhar o corpo amplifica a frequência e intensidade. O mesmo se dá no sentido inverso, ou seja, com a CONTRATRANSFERÊNCIA. É consenso que a maioria dos Terapeutas possui profundas feridas narcisísticas em aberto, as quais tentamos cicatrizar ao dar atenção aos Clientes, da forma que jamais tivemos... Não raro, tivemos que amadurecer cedo, quando deveríamos ter tido a permissão de ser crianças e nossos cuidados com os outros é a sublimação do ressentimento de que nosso amor não bastava para sermos correspondidos pelos pais, pois só sendo "produtivos" e "perfeitos" para sermos amados. Por isso, oculta-se no TOCAR em nossos Clientes, o desejo de acolhimento e amor.
Há tanto a projeção "positiva" (amor, carinho...), quanto "negativa" (ódio, raiva...) e faz parte do processo. Cabe ao profissional ter consciência disso e perceber, por exemplo, que um(a) cliente apaixonado(a) por quem lhe atende é tão somente uma transferência e não um sentimento duradouro; o mesmo se dá na fase do cliente "odiar" seu analista, momento em que o Terapeuta Holístico terá que re-experimentar suas dores mais profundas, ligadas à rejeição sentida quanto criança.

O Terapeuta Corporal tem que estar disponível e preparado, inclusive, para ser tocado. Possibilitar ao Cliente ser capaz de contato físico adequado em ambiente seguro, é criar a oportunidade para a sua auto-recuperação, com a criança interior revivenciando de modo equilibrado e positivo, a ausência e/ou o abuso de contato ocorridos originalmente. Nesse contexto, o Terapeuta Holístico, ao firmar o vínculo com seu Cliente, automaticamente abre mão de qualquer possibilidade de relacionamento amoroso/sexual com a pessoa atendida, pois, na maioria dos casos, o resultado traumático seria equivalente ao de um incesto.
A melhor forma de preservar a integridade tanto de quem atende, quanto da pessoa atendida, é o profissional manter-se em contínua terapia e supervisão, inclusive, em grupos de discussão, pois o que se constata na prática é que, independente do quão experiente seja um analista, quando está em momento de contratransferência, sua visão do caso fica prejudicada, enquanto que para os demais colegas, que não estão emocionalmente envolvidos na situação, muito mais facilmente detectam o que está ocorrendo.

Conclusões 

O contato físico intensifica o ritmo da terapia e igualmente aumenta o grau de responsabilidade e exigência técnica, o que é plenamente compensado pela excelência de resultados e gratificação profissional.
Não há mais justificativa, em nosso atual tempo de acesso globalizado às mais variadas correntes terapêuticas, à ilusão de abordar o psicofísico como se fosse "partes separadas".
A fusão entre as manobras orientais já tradicionais e a conscientização do efeito psíquico do toque reavivada pelas correntes psicoterápicas reichianas e neo-reichianas, resulta em uma terapia mais profunda e abrangente do que a simples soma das partes.
Tanto as reclamações de origem física, quanto as de foco emocionais são atendidas na mesma proposta de trabalho, em conformidade com o paradigma holístico, ampliando o leque de oportunidades em atender quantitativa e qualitativamente à Clientela potencial.
A ampliação da transferência e contratransferência pelo fator do tocar e ser tocado, obriga o Terapeuta Holístico a manter-se em contínua terapia e supervisão, resultando num indivíduo mais equilibrado e autoconsciente e, como tal, um profissional mais eficiente e um ser humano mais feliz. 

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