sexta-feira, 24 de agosto de 2018

DESPERTANDO O CONHECIMENTO - SHIVA E O YOGA

SHIVA E O YOGA
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Shiva é um personagem único na tradição do hinduísmo. Ele anda nu pelas montanhas dos Himalaias ou apenas coberto com a pele de um tigre. Seu corpo está sempre coberto de cinzas, que se justificam como um lembrete de que tudo na vida se reveste da morte e da destruição. Uma espantosa serpente se enlaça ao redor de seu pescoço azulado, como emblema dos ciclos sem-fim e da eternidade, e os cabelos muito longos, enrolados em uma trança, mal conseguem represar a caudalosa corrente do rio Ganges que ali se oculta – emblemática imagem da força vital e da incessante marcha do tempo. Em sua fronte, sobre as sobrancelhas, apresenta o crescente lunar, como um adorno que representa a restauração da vida do deus Soma (a Lua).
De seus quatro braços, dois seguram objetos mágicos e dois exibem graciosos mudras (gestos energéticos) que removem o medo ou oferecem bênçãos. Os objetos mágicos mais frequentes são o pequeno tamborete damaru com o qual ele estabelece o ritmo da dança da natureza (tandava, a dança furiosa dos elementos); o poderoso tridente trishula (que, lançado à terra com um dos seus dentes, marcou o local de fundação da cidade de Varanasi – a cidade mais sagrada do hinduísmo shaiva); um machado chamado parashu (que ele depois ofereceu a Parashurama – o herói vaishnava); a lança pashupata com o qual ele é capaz de destruir todas as eras e todos os mundos (e que depois ele presenteou a Arjuna); e a maça khatvanga, adornada por um crânio humano. Seus três olhos enxergam tudo o que existe, o que já existiu e o que ainda não veio à existência. Um colar de crânios é às vezes exibido, o que dá a ele o apelido de Kapalin (ou seja, aquele que está relacionado com os crânios).
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Shiva é também um andarilho que caminha à noite sob as estrelas e aparece nos cemitérios e nas aldeias com o pênis escandalosamente ereto, despertando o desejo nas esposas celibatárias dos brahmanes da floresta. No entanto, é o personagem que tem a família mais estável entre os grandes deuses do panteão hindu. Sua esposa Parvati e seus filhos Ganesha e Karttikeya são um modelo de dedicação à família (kulam), razão pela qual as tradições preservadas pelas famílias mais místicas (o Tantra) acabaram por incorporá-lo como patrono de suas artes. De fato, ele se tornou o patrono das artes em geral e da dança teatral em particular – de onde vem sua representação clássica como o Rei dos Dançarinos (Nataraja).
Shiva é um personagem no qual as contradições são aceitas como um fato inevitável e os problemas são transformados em solução. É por meio das contradições que se explica a dinâmica da criação da vida, pela união perfeita dos opostos bem como pela utilização heurística dos paradoxos para resolver todos os impasses que atormentam o indivíduo dentro de sua comunidade. Shiva cresceu rapidamente na imaginação popular ainda no período das Upanishads e se tornou um deus soberano, que, por ser asceta, propunha a perfeição como meta de vida. Sua doutrina popular básica é conhecida como Siddhanta (literalmente, doutrina) e se baseia principalmente nas crônicas dos Puranas – livros que detalham a história mítica do mundo.

SHIVA E O YOGA

Diz a tradição que Parvati convenceu Shiva a inventar o Yoga por compaixão. A vida é dura. A felicidade geralmente é esquiva. Nós adoecemos, ficamos velhos e morremos. Nós nos tornamos vítimas da ilusão de que isto é tudo o que existe. Ao compreender como é difícil manter a perspectiva, Parvati pediu a Shiva que inventasse um sistema que ajudasse as pessoas a lidar com o inevitável sofrimento inerente à vida de um ser humano, e ele fez isso. Portanto, ele é honrado como o primeiro professor de Yoga, e ela como a primeira aluna. Na condição de professor universal Dakshinamurti, ele se senta no monte Kailash, no ponto mais setentrional da Índia, de frente para o sul (dakshina, em sânscrito) olhando para baixo para o mundo inteiro, uma das mãos erguidas no gesto que significa: “Não tenho medo”.
Shiva é conhecido como o destruidor, na trindade indiana de Brahma (criador), Vishnu (preservador) e Shiva; mas o que ele destrói é a negatividade, a ilusão, as coisas que devem desaparecer para dar espaço às novas criações e a um nível mais elevado de consciência. A noção de Shiva destruindo e recriando o mundo em ciclos eternamente repetitivos reaparece na cosmologia do século XX com a teoria da relatividade de Einstein, e com a descoberta de que nossos corpos estão destruindo e renovando as próprias células de um modo contínuo; nós somos completamente transformados a cada sete anos.
Considera-se que Shiva inventou 84 asanas básicos para ajudar as pessoas a purificar o corpo e prepará-lo para a meditação. Esse tipo de Yoga é chamado de Hatha Yoga, que significa um Yoga que envolve energia e determinação, onde a disciplina física, nos prepara para a disciplina mental e espiritual da meditação, o Raja(régio) Yoga.

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Quem pratica Yoga sabe que esta prática envolve todo o ser. Não é possível separar, de maneira cirúrgica, a mente do corpo; o que se faz com o corpo afeta a mente, as emoções, os neurônios e a química do corpo. Mas ninguém diz: “Ah, consegui reduzir a acidez de meus gases sanguíneos!”, após uma prática satisfatória; em vez disso a pessoa dirá: “Puxa, eu me sinto ótimo!” Só nos é possível tomar consciência de nossa experiência, e a maioria de nós começa com uma consciência pouco apurada. Mas o que se faz no tapete de borracha para Yogaleva-se para a vida e vice-versa. Essa prática é como um espelho da vida. Se alguém estiver fazendo esforço excessivo e abusando, talvez faça o mesmo em outras áreas da vida. É possível conceber, através da prática, um meio de ser um pouco mais compassivo com as próprias deficiências  - e com as dos que estão à nossa volta... O Yoga tem a ver, em última análise, com relacionamentos: o relacionamento de espírito e matéria, corpo e alma, intenção e ação, professor e aluno. Somos tanto professor como aluno, em relação a nós mesmos e aos outros também.
Shiva personifica o Um, o ser humano cósmico com infinitas formas, mas uma só essência. Nas histórias, nós o vemos como amante, marido, desolado, guerreiro, homem de família, professor, intercessor pela comunidade, o contemplativo imóvel nas montanhas e o dançarino que se move eternamente nas chamas. Ele é livre para se envolver com todas as coisas, sem ficar limitado por nada. Essa liberdade é o fruto do Yoga.
 QUATRO ASANAS DE SHIVA
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Shiva não é apenas o senhor da quietude e da contemplação, mas o senhor de tudo o que vive e se move. O Kena Upanishad pergunta o que faz o ouvido ouvir, os olhos verem, os membros se moverem e assim por diante; a resposta a qualquer dessas perguntas poderia ser: “Shiva”. O sábio do século VIII, Shankaracharya, que é às vezes considerado uma encarnação de Shiva, escreveu um lindo poema no qual a alma, passo a passo, passa através de todas as coisas que ela não é num sentido supremo, concluindo, a cada vez: “Eu sou a forma do êxtase, eu sou Shiva, eu sou Shiva”. Shiva, assim, identifica ou dá nome ao nosso nível mais profundo do ser. Podemos pensar na “realidade” como algo que muda constantemente, assume uma forma e depois outra, sempre em processo de transformação de um estado a outro, mesmo quando na superfície parece estar imóvel.
Observemos uma maçã ou uma pedra. Em ambas, as moléculas estão mudando, algumas coisas estão se quebrando e outras formando. No caso da maçã, em uma semana veremos que ela começa a apodrecer, que é uma maneira de mudar de forma, de modo que novas maçãs possam nascer a partir das sementes dela. No caso da pedra, a mudança pode não ser visível durante toda a nossa vida. O princípio que causa a mudança (a qual abrange tanto a morte e a decadência da maçã velha como as sementes que um dia produzirão novas maçãs), esse princípio é Shiva, o Senhor da Dança.
Nas estátuas de Nataraja, Shiva dança sozinho em um anel de fogo. Quando essa imagem tem quatro braços, uma das mãos segura o tambor, que significa tanto o ritmo do tempo como as batidas de nosso próprio coração; a outra gesticula em direção ao seu pé erguido. Uma terceira mão é erguida no abhaya mudra, que lembra o gesto moderno que significa “pare”, mas, nesse caso, significa “não tema”. A quarta está no modo de ensinamento. Um pé, geralmente o esquerdo, está esmagando uma pequena figura disforme, que representa a ação ignorante, ao passo que o outro se ergue, indicando a liberação.
Uma forma particularmente selvagem de sua dança é o tandava, um estilo de pisar, poderoso e muito enérgico, associado hoje em dia com a dança do sul da Índia, parecendo-se a uma forma oriental do flamenco. Algumas pessoas consideram que a dança viajou da Índia para a Espanha em caravanas ciganas. A história diz que a partir da fúria e da ira, Shiva criou o guerreiro Virabhadra quando a sua primeira esposa, Sati, foi morta, e dançou num frenesi de amor e dor com o cadáver dela em seus braços até que Vishnu cortou este em pedaços.
A postura de natarajasana requer força, grande flexibilidade e grande estabilidade. Ela ensina a permanecermos equilibrados mesmo no meio de intensa emoção e atividade, e nos faz lembrar que todos os atos de destruição são seguidos de ressurreição. Ela também nos desafia a reconhecer nossos limites.
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Incorporando a postura:
- Fique em pé em tadasana. Expirando, flexione um joelho e leve o pé para trás. Estenda o braço do mesmo lado para trás e agarre o pé ou tornozelo com a mão ou uma correia.
- Mova o cóccix em direção ao chão. Deixe cair o peso da perna dobrada a partir da pélvis, puxando o pé em direção à cabeça, estirando a coxa dianteira.
- Inspire e estenda o braço livre a partir do ombro.
- Expire, ainda segurando o pé, e leve o torso paralelo ao chão, estendendo um braço à frente, segurando o pé erguido com a outra mão.
Alternativas:
 - Levante o braço da frente acima da cabeça. Segure o pé erguido com a mão de trás, formando um arco nesse lado do corpo.
- Levante os dois braços acima da cabeça e agarre o pé erguido com ambas as mãos. Puxe as omoplatas para a frente, formando um arco para trás com a parte superior do peito, equilibrando o movimento para a frente do peito com o ímpeto para cima do pé de trás.
- Pratique com as costas voltadas para uma parede; quando erguer o pé de trás, repouse a canela na parede para obter equilíbrio.
- O torso nessas versões permanece ereto.
Sustentando a postura:
- Mantenha as solas dos pés apoiadas no chão; sinta a sua base. Permita que o movimento ascendente da postura se fundamente na firmeza da perna e pé eretos. Onde você sente as linhas de energia equilibrando uma à outra? Como está a sua respiração? Como é a sua expressão facial?  A sua postura parece mais uma dança de dor e raiva mantendo-se em face de grande tragédia e estresse, ou parece mais uma dança lúdica que explora seus limites? Onde percebe a sua respiração mais claramente nessa postura?
Soltando a postura:
- Desfaça-a delicadamente. Expirando, solte o pé e abaixe-o até o chão. Traga os braços um de cada lado. Permaneça em tadasana com conforto.

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Um dos nomes mais queridos de Shiva é Chandrashekara (Aquele com a Lua em seu Cabelo). A lua crescente move-se como um ornamento em seu cabelo abundante e preso em cima, junto com o rio Ganges, com cobras e às vezes um crânio: às vezes essas coisas parecem bastante amontoadas. A lua, como a cobra, é um símbolo antigo de renascimento e regeneração. Ela representa a natureza passageira, embora cíclica, do tempo.
A cosmologia indiana é baseada no conceito de ciclos que surgem, desaparecem e se iniciam novamente. Isso ocorre num nível macrocósmico, onde um ciclo pode envolver milhares de anos, bem como o micronível humano e observável. Shiva encarna o ciclo cósmico; a lua representa o ciclo humano.
As criaturas restringidas pelas limitações da existência física estão presas pelo tempo. Shiva não está. Shiva representa a ausência de formas a partir da qual todas as formas surgem. Quando um ciclo termina, cósmico ou individual, seus elementos são reabsorvidos neles, apenas para serem reformados e recriados, como uma lua nova que se manifesta no céu noturno.
Este, em resumo, é o sentido da palavra sânscrita darshana: você vê Deus, ou uma imagem que representa o divino para você, e você é visto. Um poema infantil diz: “Eu vejo a lua, a lua me vê; Deus abençoa a lua e Deus abençoa a mim”. A Lua no céu e eu aqui na Terra existimos em relação um ao outro. A bênção chega com o reconhecimento da relação.
Como foi que a lua se prendeu no cabelo de Shiva? Foi um dos resultados da batida vigorosa do Oceano de Leite. Bem no início deste ciclo de tempo, os devas (anjos bons) e asuras (anjos rebeldes) uniram forças para bater o Oceano e Leite em busca de amrita, o néctar da imortalidade. O monte Meru serviu como o poste de bater e a serpente Vasuki, como a corda de bater. Vishnu, o Sustentador do Universo, assumiu a forma de uma tartaruga para manter a montanha no lugar em suas costas, e impedir que ela afundasse no mar. Todos os tipos de tesouro surgiram durante o batimento do oceano: Lakshmi, a Deusa da Riqueza, que se casou com Vishnu; Kamadhenu, a Vaca Realizadora dos Desejos; Chandra, a Lua; e, de maneira inesperada, uma névoa mortalmente venenosa surgiu, que queimava os olhos e pulmões de todos e ameaçava destruir toda a vida antes mesmo de amrita poder ser descoberta. Para salvar todos eles, Shiva inalou a névoa venenosa e a manteve na garganta para não engoli-la. Mas até mesmo o Senhor do Universo é afetado por suas ações; ele era forte o bastante para que o veneno não o matasse, mas este queimava a sua garganta de maneira terrível, manchando a pele, para sempre, de azul escuro. Por gratidão, e para refrescar a queimadura, a lua foi viver em seu cabelo.....var mais

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Incorporando a postura:
- Fique em pé com as costas a uma distância de cerca de 15 centímetros de uma parede. Expirando, dê um passo largo, de modo que os pés fiquem bem separados. Inspirando, erga os braços até a altura dos ombros. Expirando, vire a perna direita para fora, a partir do quadril. Expirando, leve a mão direita para o chão, ou em cima de um bloco, alinhada com o ombro; na medida em que a mão de baixo desce em direção ao chão, mantenha erguido o outro braço e mão em direção ao teto. Chegar à postura dessa maneira é como fazer meia cambalhota. Na medida em que o braço direito desce, a perna esquerda se ergue, naturalmente, não é?  Alinhe o pé esquerdo com o quadril e entre em contato com as duas pernas, desde o centro da barriga até os calcanhares. Um pé se movimenta na direção do chão; o outro pé se move no espaço. Alongue a espinha. Incline a parte superior das costas e omoplatas em direção à parede. Gire a cabeça de modo a olhar para o teto. Leve as duas omoplatas para a frente, em direção ao esterno, e abra a parte superior do peito e clavículas. Imagine a extremidade do pé erguido e da mão erguida como a forma de chifres da lua crescente. Visualize raios de luz saindo dos dedos das mãos e dedos dos pés em direção ao céu.
 Sustentando a postura:
- Confira a sua distância em relação à parede. Se estiver perto demais, dê um impulso para a frente; se estiver distante demais, a inclinação para trás causará esforço excessivo. Você está procurando um lugar onde o corpo se sinta apoiado, leve, livre de tensão e esforço.
- Pratique a postura a uns 30 centímetros da parede ou no meio da sala. Você consegue se inclinar para trás no espaço com a mesma sensação de confiança que tinha com uma parede atrás de você? Será que existe um ponto em que a parte posterior de seu corpo “sabe” que há uma parede atrás, mesmo sem tocá-la?
- Para a maioria das pessoas, a parte posterior do corpo é profundamente inconsciente. Nunca a vemos de maneira direta e temos de conhecê-la através da sensação e intuição. Será que usar a parede aumenta a sua consciência do que está acontecendo lá atrás? Há uma sensação de restrição?
- Como está o quadril da perna erguida? Se sentir cãibra, você deve estar tentando segurar a perna a partir da parte externa. Você consegue erguer o lado interno da coxa dessa perna para apoiar o seu lado externo?
- Onde está a sua cabeça? Faça uma linha imaginária desde a coroa da cabeça, passando pelo quadril, até o pé da perna erguida. Eles estão no mesmo nível?
- Observe a sua respiração. Onde você percebe com mais clareza a respiração?
Imagine essa postura como uma totalidade, como se você estivesse expirando igualmente através de todos os seus poros, mesmo aqueles da face e da cabeça. Isso faz você se sentir mais leve?
Soltando a postura:
- Faça três respirações. Depois, expirando, alongue o pé erguido de volta ao chão. Sinta como o seu corpo retoma a postura ereta a partir dessa ação. Expirando, solte os braços lateralmente.
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A vaca é um símbolo poderoso na cultura indiana; as vacas, como se sabe, são consideradas sagradas. Isto é natural se lembrarmos da antiga cultura pastoral da Índia. Para os pastores nômades, até mesmo para os fazendeiros estabelecidos, as vacas representam riqueza, posição social, até a própria vida. Conheçamos o povo Masat na África, ou leiamos alguns épicos irlandeses antigos, tais como Cattle Raid of Cooley, para ter uma impressão global de como outras culturas se sentem em relação ao seu gado.
Portanto, na Índia, as vacas representam tudo que é nutritivo, maternal, generoso, doador de vida, farto, bom. O veículo de Shiva e principal animal de companhia é Nandi, o touro, que é, ao mesmo tempo, forte e viril, um lendário servidor e amigo dedicado. Nandi é geralmente mostrado carregando Shiva e Parvati em seu lombo por todo o universo ou, de maneira mais prosaica, levando seus filhos a passeio, quando a família sai de seu lar, na montanha. Em todos os templos de Shiva, a porta é guardada por uma imagem de Nandi, colocada de tal maneira que, se posicionarmos corretamente, poderemos olhar entre os seus chifres e ver Shiva em sua forma anicônica de lingam (coluna).
Os rios, especialmente o Indo, são às vezes considerados vacas, por causa do modo como nutriram a cultura indiana ao longo de suas margens. Se pensarmos bem, existe alguma coisa em um rio calmo e ondulante, abastecido de peixes e plantas aquáticas, um lar para pássaros, um bebedouro para animais e pessoas, até mesmo um meio de transporte, que se assemelha às qualidades de uma vaca. O povo indiano utiliza todos os produtos da vaca. Eles bebem o seu leite e o transformam em manteiga, queijo ou doces. Eles cozinham com ghee (manteiga clarificada), queimam-na em lamparinas, usam-na como remédio. As pessoas das aldeias usam o esterco como combustível e material de construção: misturado à lama, produz ótimos tijolos; misturado com água, ele produz uma cobertura antisséptica macia e inodora para o chão de terra. É evidente que eles usam a força e a resistência dos bois para cultivar os campos e tirar água, para puxar as carroças, até para cavalgar. Quando uma vaca morre de velhice, o seu couro pode ser usado para fazer sandálias.
Quando o rio Ganges caiu na terra, o lugar onde ele aterrissou no Himalaia formou uma geleira. Atualmente é conhecida como Geleira de Bhagirathi, em homenagem ao rei, cujas penitências yogues atraíram a sua graça e a de Shiva; e é um lugar de peregrinação. A própria geleira tem picos que se parecem um pouco com orelhas de uma vaca; o mais importante é que há uma abertura a partir da qual o rio Ganges flui. É notável que dessa cobertura já sai um rio maduro e não um minúsculo gotejamento, como alguns rios jovens. Os peregrinos vão ali rezar, banhar-se em suas águas na fonte e levá-las para casa com eles, e é um fato que a água do Ganges pode permanecer em um recipiente fechado durante anos, sem se tornar espumosa ou perder a qualidade. Essa abertura na geleira é chamada de Gaumukh (a Boca da Vaca), reunindo as ideias de vaca e rio como uma mãe doadora de vida.

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Incorporando a postura:
- Na postura completa, sente-se sobre ambos os ísquios, os joelhos um sobre o outro, pés ao lado dos quadris. Se você olhar para os joelhos, poderá imaginar uma cara de vaca olhando para cima, para você, em que suas pernas e pés são chifre, ou orelhas. Mantenha as pernas e pés ativos, como uma base; você sentirá um alongamento na parte externa dos quadris.
- Mantenha a espinha ereta a partir da base da pélvis, inspire e erga os braços acima da cabeça. Dobre um cotovelo e leve a mão por trás da cabeça, alcançando a área entre as omoplatas com a palma. Abaixe o outro braço até a altura do ombro, gire-o até que a palma fique para cima e depois, expirando, leve esse braço para atrás de você, com o dorso da mão contra as costas, palma voltada para fora. Expirando, gire as extremidades internas de ambas as omoplatas em direção à espinha dorsal.
- Pare e perceba as sensações nos ombros. Se não sentir dor, deslize a mão de cima para baixo e a mão de baixo para cima até que as pontas dos dedos se toquem; movendo-se com vagar e atenção, continue até que os dedos das duas mãos se agarrem ou, se você tiver braços longos e ombros abertos, talvez consiga agarrar os pulsos. Você terá um cotovelo para cima, outro para baixo, com o seu peito no meio, como uma cara de vaca, com uma orelha para cima e outra para baixo. Se o joelho direito estiver por cima, o braço esquerdo estará erguido. Se o joelho esquerdo estiver por cima, então o braço direito estará erguido.
Sustentando a postura:
- Se suas mãos não se agarrarem na mesma hora (e nesse caso, bem-vindo ao clube), segure na mão de cima uma correia de yoga, ou uma gravata velha, na medida em que você forma a postura.  A sua mão de baixo pode agarrar a extremidade da correia enquanto os ombros se abrem, então aproxime as mãos, até que um dia será possível dispensar a correia. Ou não. Seja o que for que estiver agarrando, o trabalho é encontrar abertura e bem-estar nesta postura.
- Relaxe a garganta e respire plenamente, todo o percurso até a pélvis. Utilize os músculos das costas para alongar a espinha dorsal e pescoço, e leve as extremidades internas das omoplatas em direção à espinha, criando espaço na articulação do ombro. Use a respiração para criar espaço interno nos lugares apertados. Respire em suas axilas.
- Mantenha os pés e quadris firmes. Enquanto você gira os braços nos ombros, gire as coxas nos quadris. Você estará criando uma linha de energia muito firme e focada no seu centro, com os braços e pernas se abrindo para longe dela enquanto, de modo paradoxal, se movem em direção a ela. Os seus joelhos estão bem? Os pés tocam o chão? O que pensa da flexibilidade de seu corpo? Você é paciente com suas limitações?
- Observe a sua mente. O que ela faz? Você fica ansioso quando seus braços estão torcidos por trás de suas costas? Há elementos desta posição que parecem forçados? Você tem tendência a se forçar e esperar que mais espaço se desenvolva?
- Observe seus olhos, rosto, maxilares, respiração. Onde, nesta postura, você encontra a calma, a qualidade fluida, a natureza de doação generosa de um rio ou de uma vaca?
Soltando a postura:
- Expirando, solte os braços e traga-os dos lados. Descruze as pernas. Fique em pé, ou deite-se, por um momento, devolvendo ao seu corpo um senso familiar de simetria. Como você se sente?

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Em grande parte da Índia, os cães eram por muito tempo considerados animais selvagens que se alimentam de carniça, algo como os coiotes nos Estados Unidos. Eles eram associados com as margens da sociedade, de asseio e moral questionáveis, barulhentos, espertos, mas não muito confiáveis; primos em primeiro grau das hienas e chacais, e associados a zonas de cremação. Segundo essa maneira de pensar, os cães eram companheiros naturais para Shiva, que, em seu aspecto destrutivo e asceta, é também encontrado em pontos remotos tais como zonas de cremação, coberto de cinzas, acompanhado de uma legião de demônios e gnomos, que são geralmente descritos “de olhos avermelhados, de tanto tomar bhang” (no linguajar moderno, tomar bhang equivale a fumar um baseado).
Embora seja o Senhor do Universo, Shiva se coloca, de maneira intencional, fora da norma e cerca-se de pessoas ou criaturas que vivem muito além das convenções da sociedade. Como Bhairava, o mendigo com o cão, Shiva representa a realidade transcendente que tenta encontrar as pessoas em circunstâncias desesperadas: párias sociais e os desprivilegiados de todos os tipos.
Entretanto, no Nepal, Tibete e regiões vizinhas da Índia, os cães são respeitados por seu papel de guardiões e protetores. Em algumas partes do Nepal, os cães são associados à Mãe Deusa, e têm até um dia especial durante o festival de inverno de Dassehra. Alguns dos templos escavados em rochas mais famosos da Índia, em Elephanta e Ellora, possuem leões guardando a entrada. Estes não são, entretanto, os leões de pelo liso e macio da Índia, mas criaturas que portam uma notável semelhança com os “cães leões” do budismo chinês ou tibetano, aquelas criaturas mitológicas que guardam templos e palácios nos cumes nevados do Himalaia, onde Shiva faz seu lar, bem como no outro lado das montanhas na China.
Portanto, como o próprio Shiva, que é ao mesmo tempo o Senhor do Universo, um yogi contemplativo, um homem de família e amante, e o comandante militar de tropas assustadoras de criaturas da zona de cremação, os cães são leais guardiões de reis e templos, aliados confiáveis na guerra e na caça, companheiros brincalhões e marginais perigosos que viajam em matilhas. E na cultura indiana, como na Pérsia, Grécia e Egito, os cães estão associados à morte e a viagem da alma para casa.
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Incorporando a postura:
- Fique sobre os quatro apoios, com as palmas espalhadas e as mãos alinhadas com os ombros. Dobre os dedos dos pés. Inspire. Expirando, erga os joelhos e role o cóccix em direção ao teto. Alargue as omoplatas. Deixe o peso da cabeça alongar o seu pescoço em direção ao chão.
Sustentando a postura:
- Alargue as mãos, alongue os dedos. Leve os ombros para baixo por trás e leve as extremidades inferiores das omoplatas em direção à frente do corpo para abrir as suas clavículas e a parte superior do peito.
- Dobre levemente os joelhos e depois role os ísquios para cima novamente. Perceba se você fica melhor quando joelhos, quadris e tornozelos estão alinhados, ou com os joelhos levemente dobrados.
- Imagine que sua espinha se estende para formar um rabo. Alongue a extremidade de sua cauda para trás. Isso traz uma sensação de mais extensão na espinha? Imagine que a sua cauda se curva como o de um chow. Você consegue levar a extremidade de sua cauda até a borda do sacro? Será que isso intensifica a sensação de erguer os ísquios? O seu cão dá duro para se alongar? Essa postura está difícil, ou você consegue encontrar um local de descanso nela?
Soltando a postura:
- Expirando, fique nos quatro apoios, distribuindo o peso igualmente em ambos os joelhos. Ou saia da postura caminhando com os pés em direção às mãos até que você esteja inclinado numa curva para a frente com as pernas retas; então leve os braços para trás, leve as mãos às nádegas e, numa expiração, pressione as nádegas para baixo para ajudar a alavancar seu tronco para cima até a posição vertical. Solte os braços lateralmente.
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Incorporando a postura:
- A partir da postura do cachorro olhando para baixo, alargue as suas mãos e omoplatas ainda mais. Deslize as omoplatas pelas costas abaixo e erga o peito de tal modo que sua cabeça comece a erguer-se também. Expirando, leve o osso púbico para a frente até que as coxas fiquem quase paralelas ao chão e o peito se erga na direção vertical. Role os dedos para levar os peitos dos pés ao chão. Pressione os pés para baixo, erga o peito e abra o coração. Se quiser, sorria e arqueje um pouco. Onde está sua cauda agora?
Sustentando a postura:
- Siga sua respiração descendo a coluna, aumentando a distância entre o cóccix e a cabeça. Erga a parte posterior das coxas em direção ao teto e puxe o centro do osso sacro em direção à terra. Torne suaves as costelas posteriores na medida em que você desliza as extremidades das omoplatas para baixo pelas costas; faça uma pausa, inspire e leve o esterno em direção às clavículas.
- Perceba como você se sente enquanto ergue e abre as estruturas que sustentam o seu coração. Você está encurtando ou tensionando as costelas posteriores num esforço para erguer o peito? Solte-as, e leve a caixa torácica em direção à cabeça como uma conta em um colar.
- Lembre-se como são os olhos de seu cão quando ele está feliz; deixe os seus olhos refletirem as qualidades da alegria, confiança, feliz expectativa. Preste atenção na qualidade de sua respiração, especialmente na parte posterior do corpo; solte qualquer endurecimento nos pulmões ou costelas e deixe que a força dos braços, pernas e espinha sustentem você.


Fonte: O Livro de Ouro do Yoga, André de Rose, Ediouro / Asanas e Parábolas, Zo Newell, Pensamento

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